segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Lê! Medita! Ora!

«Abre a Bíblia e lê o texto. Não escolhas nunca à sorte, porque a Palavra de Deus não é para paparicar. Obedece ao leccionário litúrgico e aceita o texto que a Igreja te oferece hoje, ou então lê um livro da Bíblia do início ao fim, fazendo uma leitura cursiva. (…)
Lê o texto não somente uma vez, mas várias, e até em voz alta. (…)
Se conheces bem o trecho, e que és tentado em lê-lo demasiado rápido, não temas em recorrer a métodos que te impedirão uma leitura rápida e superficial; escreve e recopia o texto. Não lê somente com os olhos, mas procura imprimir o texto no teu coração. (…)
Que a tua leitura seja escuta/audição (audire), e que a escuta se torne obediência (oboedire). Não te apresses. É necessário ler devagar (lectioni vacare), porque a leitura faz-se pela escuta. A Palavra deve ser escutada!



O que significa meditar? Não é fácil dizê-lo. Significa antes de tudo analisar a mensagem que leste e que Deus quer comunicar-te. Por isso exige um esforço, um trabalho, porque a leitura deve transformar-se em reflexão atenta e profunda. (…)
Deves dedicar-te a esta reflexão, segundo a tua cultura, as tuas capacidades e segundo os teus meios intelectuais. (…)
Orígenes dizia: ’ A escuta não é recepção passiva de um determinado texto, mas esforço da parte do cristão em penetrar sempre mais no sentido inesgotável da Palavra divina segundo as suas capacidades pessoais e a perseverança com que ele o faz.’
Este esforço pessoal deve procurar o “cume espiritual” do texto; não a frase que se destaca, mas a mensagem central que transporta para o acontecimento da morte e ressurreição do Senhor. (…)
Tem a humildade de às vezes reconhecer que não entendeste grande coisa ou até nada. Mais tarde o entenderás. (…)
Se percebeste algo, rumina as palavras no teu coração e aplica-as a ti próprio, à tua situação, sem cair em psicologismos, introspecções e acabando por fazer o teu exame de consciência. É Deus que está a falar contigo, contempla-O a Ele e não a ti próprio. Não te deixes paralisar por uma escrupulosa análise das tuas limitações e deficiências perante as exigências divinas que a Palavra te revelou.
Certo, a Palavra é também julgamento, ela perscruta o teu coração, ela manifesta o teu pecado, mas lembra-te que Deus é maior do que o teu coração (cf Jo 3,20) e que esta ferida no teu coração vem de Deus, e que Ele a fez sempre com verdade e misericórdia. (…)
Encanta-te com Aquele que te fala ao coração, pelo alimento que Ele te dá, mais ou menos abundantemente, mas sempre salutar. Encanta-te pela Palavra que se estabeleceu no teu coração, sem a teres procurada no céu ou para além dos mares (cf Dt 30,11-14). Deixa-te seduzir pela Palavra que te transforma em imagem do Filho de Deus sem saberes como. A Palavra que recebeste é para ti vida, alegria, paz e salvação! (…)
A meditação, a "ruminatio" deve fazer com que sejas a morada do Pai, do Filho e do Espírito.


Agora, fala com Deus, responde-Lhe, responde aos seus convites, aos seus apelos, às suas inspirações, aos seus pedidos, às suas mensagens que Ele te dirigiu por meio da Palavra entendida no Espírito Santo. (…)
A “meditação” tem por objectivo a oração. Chegou o momento. Por isso, não faças grandes discursos espirituais; fala-Lhe com segurança, com confiança e sem medo, longe de qualquer olhar sobre ti mesmo, mas arrebatado pelo seu rosto que se revelou no texto em Cristo Senhor.
Dá graças a Deus pela Palavra oferecida, por aqueles que a anunciaram e ta explicaram, intercede pelos irmãos que o texto te recordou, das suas virtudes e das suas quedas, procura unir o alimento da Palavra e o alimento eucarístico.
Guarda o que viste, ouviste, saboreado na Lectio; guarda-o no teu coração e na tua memória, e vai com os homens, no meio deles, e dá-lhes humildemente esta paz e esta bênção que recebeste. Terás a força de agir com eles, afim de realizar na história a Palavra de Deus, pela tua acção social, política, profissional.
Deus necessita de ti como instrumento no mundo para fazer “novos céus e nova terra”. Outro dia espera por ti, um dia em que, vendo Deus face a face na morte, mostrarás se foste uma “carta viva” escrita por Cristo, Lectio divina para os irmãos, verdadeiro Filho de Deus.»


Enzo Bianchi, Prior do Mosteiro Ecuménico de Bose,
Orar a Palavra, uma introdução à Lectio divina


Este texto é a conclusão dos últimos 3 posts publicados neste blog, sobre a Lectio Divina pelo prior Enzo Bianchi, do Mosteiro Ecuménico de Bose.

3 comentários:

Fá menor disse...

Belíssimos ensinamentos!

Abraços

Paulo disse...

Obrigado. Faz-me lembrar um pouco o post que publiquei à dias.

Ecclesiae Dei disse...

Obrigado por tão importantes ensinamentos!